MÃE NÃO É SINGULAR
Mãe é o
corpo que nos recebe primeiro.
Quando
ainda somos desejo,
ela nos
vê por inteiro
na
entranha que nos guarda,
no útero
que nos nutre,
no
ventre que nos forma.
Foi seu
colo que nos protegeu.
Quando
nosso corpo a luz encontra,
ela chora
não de dor, embora real,
mas de
alegria porque a manhã aconteceu.
Mãe é a
mão que nos coloca no berço primeiro,
leito
que emula o lugar da espera,
casa
colorida que é também um porto seguro,
acompanhada
de lágrimas para celebrar
o
primeiro encontro do lácteo seio,
o
primeiro olhar entre os dois trocados,
o
primeiro sorriso da suave bochecha,
o
primeiro passo pelo quarto adornado,
a
primeira palavra (e se for "mamãe"!... ela vai delirar),
gestos
que um álbum pode perenizar.
Mãe é o
pé que pisa primeiro,
para nos
mostrar como andar pelo tapete do quarto,
depois
pela rua que será o nosso itinerário,
ainda
pela vida que será a nossa morada.
Mãe não
mostra como firmar o pé.
Ela
firma o seu e nós firmamos o nosso.
Mãe não
diz como ir: ela vai na frente,
desde
aquela tarde no primeiro parque,
desde
aquela manhã na primeira aula.
E quando
ela retirou o pé, por necessário,
ficou em
distância suficiente para intervir
numa
velocidade maior que o som, se necessário.
Mãe é o
som, sonido, balbucio, ouvido primeiro.
É voz
que o filho não esquece.
É a voz
que não devemos esquecer,
quando
vamos dobrar a esquina ("cuidado!),
quando
precisamos tomar uma decisão ("pense bem!")
quando
nos preparamos para casar ("isso é para sempre, meu filho"),
quando
estamos às vésperas de uma viagem ("não está esquecendo nada?"),
quando
desejamos mergulhar em águas mais profundas ("perigo!)
quando
estamos imersos em alguma tristeza ("filho, eu te amo")
quando
trilhamos o caminho do erro ("volta, meu filho!").
Mãe é
mente que nos ensina a pensar.
Mãe é
coração que nos mostra como amar.
Para uma
mãe nossas palavras nunca exageram.
nossas
imagens jamais excedem.
Mãe é
mãe sempre.
Sua
ternura a torna eterna.
Filho, o
filho bom, é filho sempre,
mesmo
depois que mamãe parece que se tornou
apenas
uma foto ou uma coleção de imagens na memória.
A mesa
tem o cheiro dela.
A casa
tem o seu jeito.
Nossa
vida tem o seu perfume.
Mãe,
mesmo morta, é amor que nos encanta.
É
presença que ainda nos acalanta.
É balanço
-- e tantos foram para hoje lembrar --
que
ainda nos faz muito alto voar.
Mãe é um
coletivo de palavras,
umas
descrevem, outras imaginam.
Mãe é um
buquê de imagens,
e tão
boas são que, por verdadeiras, nos fascinam.
Ao
filho, cabe ajoelhar-se diante de Deus
e por
sua mãe agradecer.
Quem
nunca agradeceu pode hoje começar.
À mãe,
cabe curvar-se diante de Deus
para à
sua imagem corresponder,
sabendo
que há uma boa jornada a realizar.
Israel Belo de Azevedo