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8/22/2014

Relembranças 1 - A moça de Mutum e o cowboy de Aimorés



Era tarde de sábado na cidade de Aimorés estado de Minas Gerais. Um sábado qualquer, de um mês qualquer, de um ano triste. Todos os sábados pareciam iguais. Ela saía de Resplendor, no trem Rápido, descia em Aimorés e tomava um ônibus para Mutum. Na segunda-feira fazia o caminho inverso. Em Resplendor, cuidava da mãe doente, estudava as matérias do seu curso à distância, chorava seu amor perdido. Tudo isso fazia daquele ano, um ano triste.

Apesar de todos os seus sábados parecerem iguais, aquele foi diferente. Ao chegar à estação ferroviária em Aimorés, atravessou a praça central até o bar  que era uma espécie de rodoviária. Chegou a cara no buraco do vidro e pediu:
- Uma pra Mutum.

Olhou o papel colado no vidro, descobrindo o aumento da passagem ocorrido naquela semana. Pediu que a moça esperasse um pouco antes de destacar a passagem. Conferiu seu dinheiro. Ele não dava para a viagem.

Saiu do local cabisbaixa e atravessou novamente a praça, como se estivesse carregando sobre os ombros a tristeza de todos os habitantes da terra. Não tinha ideia do que fazer! Sentou-se em um dos bancos. Revirou a bolsa mais uma vez na esperança de achar algum dinheiro solto em algum compartimento da mesma. Tempo perdido, não encontrou nada. 

Contou novamente as cédulas e as moedas. Nenhuma delas havia dado cria. Colocou-as no bolso do jeans desbotado.

Caminhou até a estação, à procura de alguém conhecido que pudesse lhe socorrer. A estação estava deserta. Voltou à praça, sentando novamente no mesmo banco. Seus pensamentos giravam desconexos. A única coisa sóbria que lhe vinha a mente era a frase:

- Deus mande alguém pra me socorrer! Tem que ser agora Deus, porque senão o ônibus parte.

Com a cabeça  baixa e as mãos na testa ali ficou à espera do milagre. Foi quando viu um par de botas em pé à sua frente. Seus olhos ficaram fixos. Depois pouco a pouco foi vendo parte a parte aquela figura impoluta. Primeiro a calça jeans Lewis. Depois, a fivela grande e prateada do cinto com a figura de um cavalo.  Viu a camisa xadrez de vermelho, o rosto másculo e bonito emoldurado com um chapéu de couro. Parecia a perfeição em forma de homem. 

Com voz mansa lhe falou.
- Posso me sentar?
- Oh sim! Claro! – Respondeu a moça no grau extremo de sua timidez.

A conversa foi iniciada. Ele falou de música, de rádio. Era de Belo Horizonte, mas estava em Aimorés, trabalhando na rádio e cantando música sertaneja.

- E você, o que faz aqui? – perguntou com ar simpático.
A moça iniciou sua história recente. Após contar seu drama, ele abriu a carteira retirou uma cédula e lhe estendeu:
- Vá lá e compre sua passagem.

Ela saiu apressada rumo ao guichê. Não antes, de fazê-lo prometer que a esperaria ali para receber o troco.

Ao voltar o banco estava vazio. Ele havia sumido. Olhou por todos os lados, mas não o encontrou. Nem pôde agradecê-lo!

Mais de trinta anos são passados. E eu, a moça de Mutum agradeço sempre a Deus a sua vida  e minha prece nesse tempo todo é a mesma:


- Deus, se ele ainda estiver vivo, estende tuas mãos de bondade e misericórdia sobre ele, o anjo cowboy, que o Senhor usou para me socorrer, naquele sábado triste em Aimorés.