10/16/2018

O vínculo afetivo na aprendizagem - homenagem ao dia do professor



Eu me lembro daquele tempo com saudade
Quando caminhava pela estrada poeirenta
Via também árvores e flores, pássaros e borboletas.

Quando me deparava com a rigidez da professora
Sentia também a alegria da descoberta dos sons dos símbolos
que viravam palavras, das palavras que viravam frases
e das frases que viravam sonhos.

Quando de volta à casa no meu  cansaço infantil
Aconchegava-me ao colo da mãe, ouvia elogios do pai
E brincava de estudar com o irmão.
Ele cobria as letras do ABC e deixava uma só
Visível por um buraquinho no papel
Orgulhosamente eu dizia seu nome, ouvia seu som
E deliciava-me com seu sabor escorregando por minha língua.

Na realidade infante aprendia e brincava
Na fantasia reinante brincava e aprendia
Mergulhada bem dentro do livro eu nadava, sonhava e sorria.

É gratificante quando nos pomos à leitura e ao estudo de grandes teóricos da educação. Os benefícios se dão pelo fato de nos alimentarmos espiritualmente com ideias que foram desenvolvidas para o bem da humanidade no geral, da criança no particular e de nós mesmos quando caminhamos juntos com o autor e a cada passo e espaço nos lembramos da própria história. A saudade chega bem de manso numa reflexão doce, morna e melancólica, mas também vívida, bela e delicada por saber que nalgum lugar, pessoas amadas, noutros tempos dedicaram-se para mediar nossa aprendizagem. Leigos mestres que não conheciam termos corretos e as técnicos do seu fazer e ainda assim o faziam tão bem.  Não conheciam teorias, só sabiam expressar amor. Apresentavam não só o conteúdo, mas a si próprios numa tarefa de serviço ao outro para o bem do coletivo. Porque educar é um grande bem. Tão amplo, capaz de abarcar várias gerações, a partir de uma criança.

Eu fui essa criança. Tal como a mãe de Reuven Feuerstein, que mediava sua aprendizagem aos três anos de idade na mesa da cozinha eu fui mediada por meu irmão no chão da nossa casa. Tal como o próprio Feuerstein que aos nove anos ensinou um garoto de quinze a ler e escrever meu irmão me ensinava com pilhérias e brincadeiras de menino travesso. Quanto a mim, me deliciava com as descobertas. Feuerstein se tornou um grande e renomado educador. Ajudou a fazer homem, grandes homens como Ariel Sharon ex. primeiro ministro de Israel. Meu irmão não se tornou um homem renomado, só um grande homem.

Da rigidez da professora só tenho más lembranças. Saudade mesmo, tenho dos colegas gêmeos, talvez mais por solidariedade, porque é uma emoção de muito mais tristeza do que qualquer outra lembrança da infância. O rememorar dos fatos tem gosto de melancolia remetendo-me a uma existência passada com as estratégias de punição em nome de uma educação austera. Castigo indevido que na minha pouca idade nunca entendi, nem entendo agora na muita idade. É certo que aquela professora não conheceu Piaget, Vygotsky, Albert Ellis. Também nunca soube de Carl Rogers, Kurt Lewin, tampouco Skinner. Por isso não praticou modificabilidade cognitiva,  introjeção da autoestima, nem deu aos gêmeos o prazer do sucesso como reforço, o mais poderoso reforçamento que um aluno pode ter. Eles não aprenderam. Eles desistiram.

Eu, continuei, continuo, construindo meu saber sobre o alicerce do aconchego da minha mãe, dos elogios do meu pai, da mediação inocente do meu irmão. Tracei minha trajetória, superei as etapas queimadas, planejei minha vida. Hoje em meu “comportamento consumatório”, buscando meu “objetivo prioritário” forçada pelas circunstâncias dou uma parada no caminho para refletir sobre saudade e depois mergulhar novamente e no meio do livro nadar, sonhar e de novo sorrir. Alegrar-me por ter existido teóricos que se dedicaram à mais nobre tarefa da educação: ajudar  outros em sua construção sobre as bases do afeto.
Senhorinha
Belo Horizonte, 28 de setembro de 2018